segunda-feira, 13 de julho de 2009

Filosofia & Cia - Ano I - Número 7 - Julho de 2009

São Tomás de Aquino e as idéias de Charles Darwin

Um pouco de história: Numa época em que a Igreja ainda buscava em Santo Agostinho grande parte de sua sustentação doutrinária, São Tomás de Aquino (1224-1274) formulou um amplo sistema filosófico que conciliava a fé cristã com o pensamento grego de Aristóteles. Não se tratava apenas de adotar princípios opostos aos dos agostinianos, que se inspiravam no idealismo de Platão (corrente chamada, por este motivo, de neoplatonismo), mas cultivar o princípio aristotélico de que cabe à razão ordenar e classificar o mundo para entendê-lo. O pensamento de Aristóteles respondia melhor aos “novos tempos” do que o neoplatonismo e a ideia do tomismo (como é chamada a filosofia inaugurada por Tomás de Aquino) era de levar para dentro da Igreja um pensamento que não concebia um Deus criador nem a vida após a morte.

De volta ao século XXI: Estamo comemorando em 2009 o bicentenário de nascimento de Charles Darwin, o pai da teoria da evolução das espécies. As ideias revolucionárias do naturalista inglês são os pilares da biologia e da genética e estão presentes em muitas áreas da ciência moderna. Sem a teoria da evolução, a moderna biologia, incluindo a medicina e a biotecnologia, simplesmente não faria sentido. Os cinco pilares do Darwinismo são a evolução dos seres vivos (o mundo não foi criado por ninguém, nem é imutável, e que os organismos estão em um lento e constante processo de mutação); o ancestral comum (cada grupo de organismos descende de um ancestral comum e todos os grupos remetem a uma única origem da vida na Terra, a ameba original); a multiplicação das espécies (elas tendem a se diferenciar, criando novas espécies); o gradualismo (as populações se diferenciam gradualmente, de geração em geração) e a seleção natural (os seres vivos sofrem mutações genéticas e podem passá-las a seus descendentes, que têm sua herança genética posta à prova pelas condições ambientais em que vivem).

Apesar de plenamente aceito e celebrado como um ponto de partida para um grau de conhecimento sem precedência sobre os seres vivos, o evolucionismo de Darwin vem sendo deixado de lado em algumas escolas, que preferem ensinar às crianças e aos jovens, nas aulas de ciências, a teoria do criacionismo. Trata-se da explicação bíblica para a origem da vida, cuja ideia básica é a de que Deus criou tudo, desde o homem, a mulher, os animais, as plantas, há 6.000 anos. Como explicar esta atitude, caro leitor, principalmente se destacarmos que este fato não vem acontecendo apenas em países pobres, ignorantes e subdesenvolvidos, mas nos EUA, na Inglaterra e em outros países campeões na produção científica ? Como entender que apenas um em cada dois americanos ou um em cada quatro ingleses acreditam que o homem é produto de milhões de anos de evolução ?

Reflexão: A explicação certamente tem conotação religiosa e passa pelo fato de que a descoberta dos mecanismos da evolução enfraqueceu o único bom argumento disponível para a existência de Deus. A biologia desmentiu a natureza especial do homem e o relegou à posição de um “mero descendente do mundo animal”. Impacto semelhante só é comparável com a descoberta por Copérnico que a Terra não era o centro do universo. Talvez estes tenham sido os dois mais fortes golpes contra a auto-estima da humanidade. Infelizmente, a teoria da evolução é percebida por alguns como uma arma projetada para destruir a religião, a moral e o potencial dos seres humanos. Ciência e religião já andaram de mãos dadas pela maior parte da história humana, mas Darwin foi, seguramente, um dos responsável por esta separação. Tudo bem que suas teorias causam mal-estar em muita gente, mas difícil de aceitar são os casos em que o darwinismo é considerado um inimigo a ser combatido.

Manda o bom senso que não se misturem ciência e religião. A primeira se preocupa com os mistérios do mundo físico, enquanto a segunda, os mistérios do mundo espiritual. Porém, elas não necessariamente se eliminam, vide o fato de que Darwin era religioso e chegou a se preparar para ser pastor da Igreja Anglicana. Elaborar uma teoria que ia contra os dogmas da Bíblia era para ele motivo de enorme angústia. Darwin nunca declarou que a Bíblia estava errada e manteve sua fé religiosa até os últimos anos de sua vida.

É claro que em sua fé, os criacionistas têm o pleno direito de acreditar que Deus criou o mundo e tudo o que existe nele, mas coisa bem diferente é impor esta maneira de enxergar a natureza às crianças em idade escolar, renegando fatos já plenamente comprovados pela ciência. Esta atitude nega às crianças os fundamentos da razão, substituindo-os pelo pensamento sobrenatural. Não há problemas também no fato de que o criacionismo seja dado nas aulas de religião, mas ensiná-lo na aula de ciências é um ato que pode trazer graves consequências, pois ele não é adequado para ser ensinado em aulas de biologia para explicar a origem das espécies, pois faz com que os jovens desde cedo confundam crença e superstição com razão e ciência.

P.S: A coluna deste mês se valeu de informações publicadas na Revista Veja do mês de Fevereiro de 2009

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